pai,

queria gravar um cd com várias músicas novas & velhas e pôr pra você ouvir num dia de domingo. depois, eu sentaria na sua cama e leria pra você uma história genial sobre alguma coisa incrível que a gente ficaria debatendo e articulando até de repente o assunto virar sua infância, meus avós, minha infância, seus avós. daí devagarinho & despretensiosamente, como só o domingo sabe ser, a gente ia virando pro lado e acabava num cochilo – da maior importância. porque como bem disse sartre, três horas é sempre tarde ou cedo demais para fazer qualquer coisa. depois, demonstrando carinho sem pudor e sem soar piegas, eu gostaria de te dizer, com firmeza de gestos & palavras, que também me orgulho de você, meu pai. a pessoa mais jovem de quem tenho notícia. e aí eu aproveitaria, nesse domingo, pra te falar que não existe pai sem filho nem filho sem pai e que por isso somos igualmente responsáveis pelas dores e delícias dessa relação. aí depois um beijo, um abraço, boa noite, te amo, se cuida. ir embora em paz. na volta pra casa eu ia pensando em como sua existência poetiza a minha e em como tenho muito mais de você do que poderia supor. isso eu te contaria num outro dia de domingo.

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júlio,

vim para gostar mais de mim. me admirar. crer na minha coragem tanto quanto creio na minha covardia. vim para mostrar a mim mesma que existo. sim, existo. tenho medo e existo. sou tímida e existo. sou reservada e existo. tenho um certo apreço em parecer invisível e existo. consigo existir de qualquer jeito, de todos os jeitos. minhas características não são incompatíveis com o mundo – cabe tudo no mundo que somos nós.

vim para surpreender a mim – também um pouco a você. sair da zona de conforto. que não tem me trazido conforto. tive falta de ar esses dias. a vida faz isso comigo, me deixa ofegante. a vida tem me feito ter medo de morrer, como nunca antes. mas sobretudo, julinho, a vida tem me feito ter medo de viver. e tudo que dá medo intriga e fascina a gente na mesma medida. foi por isso que eu vim.

manoel,

desde que fiquei sabendo de sua partida que estou meio perdida, sem saber o que dizer. ficou claro pra mim que nada nadica do que eu escrever representará o que realmente desejo dizer. tudo isso porque é muito difícil falar daquilo que é grande: como manoel de barros. então vou ser simples, como você seria: obrigada pelas palavras. por todas elas. imagino que um poeta não tenha a dimensão do percurso que sua palavra atravessa dentro e fora desse mundo. e vim aqui te dizer, manoel, que eu sei a dimensão da sua palavra: é um sem-fim. prometo a mim mesma não deixar que você morra em mim. agora vai, faz o que você sabe fazer de melhor: voa.

meu carinho,

tainá

 

jean,

já andava te acompanhando com grande empatia pelas redes sociais, até o dia em que ganhei teu novo livro. aí ficou impossível disfarçar, jean, o quanto te admiro. percebi, cá dentro, que você é o candidato em quem sempre quis votar – e não será dessa vez, pois voto em recife – um político que não disfarça e nem pretende disfarçar o humano que carrega e é, sem apelação, com verdade e espontaneidade – digo: é isso que chega até mim. e isso que chega até mim, jean, é a clara compreensão do que já disse o filósofo: “nada do que é humano me é estranho”. querido, como é bom lhe ler/ouvir e saber que temos tanto em comum: caetano, psicologia, literatura, gosto pela escrita, respeito ao ser humano. mas não pense que se trata de puro egocentrismo: é um tanto maior. sabe, jean, suas falas e práticas me trazem otimismo e coragem – mesmo que eu nem sempre saiba o que fazer com eles, e não sei –  é muito bom senti-los. espero que o que escrevo não transpareça bajulação ou puxa-saquismo, embora não haja garantia. espero sobretudo porque não é disso que se trata, de fato. não é sobre ser um ideal, é sobre ser humano. ser humano é tudo o que me interessa. possibilitar aos outros serem humanos é tudo o que me interessa. instigar os outros a serem humanos é tudo o que me interessa. é por essas e outras que você me interessa. ademais, obrigada pela paixão, sensibilidade e senso crítico. obrigada pelo esforço em tornar nossa casa em um ambiente com mais vida.

um abraço carinhoso,

tainá

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querida,

obrigada pelo presente de aniversário que você me deu: uma luz de mil sóis em plena noite, alta madrugada. querida, sua presença foi como uma flor de laranjeira tropeçando no meu jardim de cimento. não sei se falo dos sorrisos, da conversa fiada, da embriaguez, da intimidade (e ainda a cor & som dos nossos amantes em cena), da leveza. você, que me chamou de poetisa preferida, não sabe que é uma das pessoas mais poéticas que conheço. tacizita, isso era saudade e a gente nem sabia. que emoção tão grande redescobrir um amor assim. se é que um dia a gente se perdeu, esse encontro pagou tudo e ainda sobrou troco.

com amor,

tai

p.,

escrever é minha droga. meu antídoto. espelho, espada, esfinge. escrever me faz parir o agora, fogo entre as pernas, sem dó nem piedade. p., escrever me faz existir – mais do que respirar. principalmente quando a morte é uma sombra. escrever me põe no olho do furacão de onde vim e me identifica, me delimita, me dá a exata medida. p., essa coisa tão selvagem que é escrever me humaniza mais que tudo. escrever é meu afago na alma, cafuné às avessas. escrever é minha lamparina acesa num quarto escuro: ilumina e me faz enxergar. escrever é meu óculos de grau – eu, que sempre fui míope. p., não se trata de jogo de palavras, isso ou aquilo: escrever tem o tamanho do que eu sou. escrever é tudo o que eu tenho. é o que eu quero ter.

com carinho,

 

caro setembro,

impossível não esboçar um sorriso quando você chega de mansinho. abri essa tal máquina de escrever cartas no dia 01 de setembro e estava quase convencida do acaso, quando uma amiga comentou: quando entra setembro entra a boa nova. e lembrei do óbvio: setembro é meu ano novo. o mês que nasci e renasço – e morro um pouco também. não há como se falar de nascimento sem se falar de morte. sei bem que nem sempre estamos disponíveis a isso, mas quero estar, setembro, disponível para você de peito mais aberto que o sol. eu, que tenho lá minhas sombras e esconderijos, penso que você, setembro, é a melhor parte de mim. a parte que espero resgatar a cada novo nascimento.

setembro, quando eu crescer quero ser como você.

beijo na testa,

tainá

o.p.,

trouxe na mala além de uns objetos de pedra-sabão e anéis de pedras ditas preciosas, um enorme enigma no peito. que ainda não se desfez. que talvez não se desfaça. que fique claro que não se trata de um mistério a se desvendar. é uma emoção-enigma. o.p., depois de te conhecer, com olhos atentos, coração idem, com curiosidade & aflição, medo & alegria: me desconheci. que sensação nobre. obrigada por esse suvenir, ouro preto.

com amor,

tainá

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paulinho,

demorei quase dois meses para conseguir desaguar essa carta depois que te vi. paulinho, você mexeu comigo numa noite de sexta qualquer como quem não quer nada – mas é tudo. minha antena captou sua presença-pessoa com mil e um sinais, cinquenta mil sensações-sentimentos, um sem fim de suspiros, um minuto de silêncio. paulinho, uma noite de sexta qualquer é capaz de mudar nossa vida por inteiro, mesmo que ninguém além de nós perceba. desculpa o existencialismo, paulinho, mas minha vida perdeu & ganhou sentido infinitas vezes numa espécie de looping enquanto eu te assistia. sabe, tive uma disposição inédita de enfrentar uma fila de fãs para te ver de perto. eu, que não tenho todos os seus cds, eu que estou longe de saber todas as suas músicas de cor, eu que sou apenas um rapaz latinoamericano sem dinheiro no banco

ah, paulinho, você me paga!

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